No cais, lá estavam os escaleres dos poveiros, com um pouco de água a
estremecer no fundo e encharcadinhos de sol.” - in CASTRO, Ferreira de. A
Selva, Livraria Editora Guimarães & Cª , Lisboa, 1957 (18ª edição),
p. 75
Estes poveiros, de Ferreira de Castro, arribariam a Porto Alexandre em 1921.
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Estes poveiros, de Ferreira de Castro, arribariam a Porto Alexandre em 1921...
Tudo começou quando em 1920 as autoridades brasileiras determinaram que
os pescadores estrangeiros só poderiam continuar a actuar nas águas do
Brasil desde que: se naturalizassem brasileiros até 12 de Outubro do
referido ano, nacionalizassem as suas embarcações, e organizassem
“companhas” de modo que dois terços da tripulação de cada barco fosse
brasileira. Os pescadores da Póvoa de Varzim obedeceram às duas últimas
condições, arvoraram nos seus barcos a bandeira do Brasil e pediram,
através de editais, a colaboração de tripulantes brasileiros, mas na sua
quase totalidade recusaram a naturalização. Em consequência, tiveram
que regressar à Póvoa. Eram cerca de mil. Em 30 de Outubro de 1920
desembarcou em Lisboa o primeiro contingente de 250 pescadores, ao qual
se seguiu outro composto por 302, desembarcados em Leixões, em 5 de
Novembro. Juntamente com os poveiros regressaram do Brasil pelos mesmos
motivos, pescadores de outras proveniências, sendo embora em menor
número, daí a Póvoa de Varzim ter sentido de forma mais dramática os
problemas sociais e económicos deflagrados em resultado do retorno em
massa de indivíduos, para os quais não estava preparada. Calados os
rumores da calorosa e patriótica recepção, logo uma crua miséria se
abateu sobre os regressados, tornando urgente a tomada de medidas a fim
de debelar tamanha desgraça. Coincidiu esta situação com o projecto a
levar a cabo pelo Norton de Matos, que procurava assentar no litoral sul
de Angola as bases de uma indústria piscatória voltada para o futuro.
Lançada a ideia da instalação de uma colónia de poveiros em Porto
Alexandre, estava finalmente encontrada a solução para a realização da
sua proposta. E assim... “Em 24 de Fevereiro de 1921, no paquete
“África”, partiam de Lisboa para Porto Alexandre 62 dos pescadores
poveiros regressados do Brasil, que chegaram ao seu destino em 14 de
Março; à frente tinham sido enviados os seus barcos e aprestos, que às
praias africanas levavam, pela primeira vez, elementos típicos do areal e
da enseada da Póvoa". Entretanto o General mandara construir em Porto
Alexandre um bairro destinado às famílias dos pescadores poveiros,
procurando deste modo atrai-las à fixação no solo de Angola. No jornal
“O Comércio da Póvoa de Varzim”, datado de 11/10/1921, vinha a seguinte
referência:
“Um dos pescadores poveiros idos para Porto Alexandre, Manuel Francisco
Trocado, dizia em carta dos finais de 1921: “Acrescentarei ainda que o
sistema de pesca que adoptamos é muito fácil: fizemos uma sacada, como
uma nassa, que nos importou em 2 contos. Lança-se ao mar, seguras as
extremidades por 2 barcos, e em um, ou, no máximo em dous lanços,
carregamos o barco de peixe”. –
Por A. M. Mendes, segue o apontamento histórico – Pescas em Portugal: Ultramar – Revista Portuguesa de Ciências Veterinárias:
«Estava-se em 1931, quando foi publicado o seu primeiro relatório de
serviço (Carneiro, Carlos (1931) – A indústria da Pesca no Distrito de
Moçâmedes. Anais Serv. de Veter., pág. 19-20). Nesse trabalho começa
por evocar o ano de 1921, quando no Brasil uma lei idêntica à que dera
origem à primeira colonização de Moçâmedes voltou a ser publicada
exigindo que os pescadores portugueses, que exerciam a sua actividade
nas águas do Brasil adoptassem a nacionalidade brasileira. Carlos
Carneiro escreve que: “Em massa repudiam tal violência e regressam ao
seu país”. Essa lei acabou por ser revogada e o Brasil voltou a
permitir a entrada de todos os pescadores poveiros que em águas
brasileiras quisessem pescar. Era então Alto-Comissário em Angola o
General Norton de Matos que logo determinou que todos os repatriados
que quisessem poderiam organizar-se em colónia piscatória na baía de
“Porto Alexandre”. Imediatamente começaram as construções de habitações
e de instalações modelares para a preparação do peixe. Os poveiros
encontraram bom acolhimento mas a demissão de Norton levou ao abandono
da colónia, ainda em implantação e acolhimento. Alguns desses poveiros
voltaram para as suas terras de origem ou deslocaram-se para outros
pontos de Angola e Carlos Carneiro conclui: “Não fracassou esta
tentativa de colonização porque muitos desses poveiros estão trabalhando
em Angola, por sua conta ou ao serviço das indústrias de pesca e são,
sem receio de confronto, os melhores que no sul se encontram. Ficou
também de pé o elegante bairro poveiro que embeleza a mansa baía de
Porto Alexandre e que constitui um dos muitos padrões de glórias do
governo, formidavelmente grandioso do Excelentíssimo General Norton de
Matos”.
Alguma bibliografia consultada:
in GONÇALVES, Flávio. Os pescadores poveiros em Angola e Moçambique , Póvoa de Varzim Boletim Cultural, volume VI nº 2, C.M. da Póvoa de Varzim, 1967. pp. 286/288
in GONÇALVES, Flávio. Os pescadores poveiros em Angola e Moçambique , Póvoa de Varzim Boletim Cultural, volume VI nº 2, C.M. da Póvoa de Varzim, 1967. pp. 286/288
Imagem: 1. Grupo de poveiros em Porto Alexandre. 2. Uma das primeiras
"catraias" poveiras que chegaram a Angola a partir de 1921. 3. Uma
familia podeira sobrevivente.
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